#26 - Sobre rasgos no sofá, cactos e macarrão
o Sol insiste em se mostrar presente por detrás das nuvens cinzas, mas mesmo esse ato de persistência não faz desse domingo um dia ensolarado.
coloquei meu cacto na soleira da janela, na esperança de que um raio de luz faça-o lembrar do deserto e assim desistir de morrer.
sua caminhada acelerada em direção a morte me entristece um pouco, faço de tudo para que viva - mas o tempo paulistano não ajuda.
hoje acordei sozinha e a primeira vez que conversei com outro ser humano foi na hora de pagar o pacote de macarrão que comprei no mercado.
- débito ou crédito?
- débito...
misturei no extrato de tomate um tanto de molho inglês e açúcar, o sabor resultante me rendeu um orgulho extraterreno. minha vó classificaria esse êxito culinário como um sinal claro de que já poderia me casar. mas não quero, e duvido que um casamento se sustentaria apenas com macarronadas.
ela sabe disso, e mesmo tendo me ensinado a costurar, cozinhar e cuidar da casa, não nutre a esperança de que isso seja suficiente para que eu me interesse por alguém para sempre.
enquanto costuro um rasgo no sofá - feito há meses, resultado de algum pequeno atrito que não lembro de ter acontecido - revejo mentalmente minhas perspectivas de futuro. talvez as únicas que me interessem sejam justamente aquelas que são impossíveis de acontecer.
o remendo sai tão mal feio quanto o próprio rasgo, dando ao sofá uma aparência semelhante ao de um braço mal costurado. percebo que era melhor ter deixado como estava.
sento com o pranto de spaghetti no sofá, mal costurado, de frente para a janela e sinto o Sol aos poucos aumentar. olho de relance o cacto e vejo que ele não morrerá, pelo menos não hoje.
Sarah
Mural de avisos
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🎵 Para ouvir:
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No que concerne às coisas humanas, não rir, não chorar, não se indignar, mas compreender.
Espinosa
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A vez em que alunos de Letras entrevistaram Clarice Lispector
“O neoliberalismo fez com que passássemos a nos ver como competidores em vez de colaboradores, consumidores em vez de cidadãos, pessoas que acumulam em vez de compartilhar, que têm em vez de dar, que trabalham sem parar em vez de ajudar; pessoas que não só estão ocupadas demais para ajudar os vizinhos, mas que nem sequer sabem o nome dos vizinhos. E deixamos coletivamente isso acontecer. Em muitos aspectos, essa foi uma resposta racional. Pois, no capitalismo neoliberal, se eu não cuidar de ‘mim’, quem vai cuidar? O mercado? O Estado? Meu empregador? Meu vizinho? Improvável. O problema é que uma sociedade egoísta ‘voltada para o eu’, na qual as pessoas sentem que precisam cuidar de si mesmas porque ninguém mais o fará, é inevitavelmente uma sociedade solitária”.
Noreena Hertz
@ da Semana
(Com todos seus defeitos, eu ainda AMO o Instagram. Graças a um tantão de pessoas bacanas que criam conteúdo por lá, a rede social é uma das minhas maiores fontes de inspiração)
Minha mãe me contou esses dias que ela tem andado com uma sacolinha quando sai de casa para pegar os lixos que vê na rua. Poucos dias depois conheci o projeto Lixo de Praia que mostras as sujeiras encontradas no literal do Brasil. Fiquei pensando muito sobre essas iniciativas e te convido a também recolher lixo que você vê no chão por aí. Pode parecer muito clichê o que vou dizer agora, mas um futuro melhor depende de todos nós
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